Era uma vez... já lá vão muitos lustros, um Senhor Infante, homem bem apessoado e insinuante, fez pousada em Leiria.Vivia, então, na cidade, uma senhora que aparentava uns trinta anos, muito linda e elegante, chamada Ana Ricardina, natural da Praça de Almeida, lá para as bandas da raia, de ascendência espanhola, segundo uns, de raiz portuguesa, segundo outros.
O Senhor Infante viu a linda Ricardina e logo se apaixonou. Amaram-se muito e muito ternamente. E, passados tempos, a Ricardina começou a perder a elegância e a mostrar os sinais da maternidade.
Ia nascer um menino, o seu unigénito.
Mas o Senhor Infante já feito Rei abalou ... e abalou para longe.
E o menino nasceu, mas o pai jamais o viu.
Ele tinha olhado para baixo; ela tinha olhado demasiado para o alto.
Compreensivo e bom pai, não os abandonou.
E a mãe e o filho passaram a viver de uma pensão que um capitão lhe mandava entregar em nome do Senhor Rei.
Mas um dia o capitão morreu e a pensão ... morreu também.
A Ricardina que já era conhecida por Ana de Bragança começou a sentir dificuldades económicas, por falta da pensão. Mas ela era mulher forte e decidida, com sua grande vontade de viver, e, no desejo de amparar o seu menino, fez-se curandeira. Passou a curar a espinhela caída como então se chamava, popularmente, ao estado de fraqueza geral.
E assim foi vivendo de saudade do Senhor Rei, até que Deus a chamou a si, aos setenta e dois anos de idade, já lá vão muitos lustros, deixando o seu menino, já feito homem e com geração.
(in Anais do Município de Leiria, João Cabral)
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