Após uma letargia de quase cem anos,
Óbidos voltou à vida. Ironicamente, a própria decadência
da vila a partir da revolução liberal continha as sementes do
seu renascimento. O burgo amuralhado conservou-se quase intacto até aos
finais da década de 30, altura em que o Secretariado Nacional da Propaganda,
de António Ferro, o «descobriu», transformando-o em chamariz
turístico e símbolo da portugalidade. Nestes últimos anos,
a dinâmica socioeconómica do concelho tem-se desenvolvido à
margem do espaço intramuros, cada vez mais ocupado por segundas residências
e estabelecimentos comerciais.
Em 1210, Óbidos insere-se na Casa das Rainhas, ganhando a protecção
real e recebendo inúmeras visitas da Corte durante a Idade Média.
Ao longo dos séculos, Óbidos tomou muitas vezes o partido dos
derrotados. Foi assim no reinado de D. Sancho II, durante a luta com o irmão,
o futuro D. Afonso III, em 1246, a vila resistiu oito meses ao cerco das hostes
do infante D. Afonso. D. Fernando Ourigues de Aboim, o alcaide, só se
sentiu desobrigado do voto de fidelidade a D. Sancho II por morte deste. D.
Afonso III devolveu as chaves a D. Fernando e atribuiu à vila o título
de «mui nobre e sempre leal».
Nos finais do século XV, D. Leonor, mulher de D. João II, manda
edificar o Hospital Termal das Caldas. A aglomeração cresceu rapidamente,
transformando-se nas Caldas da Rainha. A partir de então o desenvolvimento
transfere-se para as Caldas, assim como as visitas reais, iniciando-se a decadência
de Óbidos. Um processo que teve uma breve interrupção,
em 1782, quando D. Maria I, o seu marido, D. Pedro, e a Corte, fugidos da insalubridade
das Caldas, se instalaram na vila, em casa do fidalgo João Félix
de Brito Pegado, hoje Solar da Praça de Santa Maria. Por cima da porta,
uma inscrição recorda o acontecimento.
O castelo e o conjunto urbano foram classificados como Monumento Nacional no
dia 5 de Janeiro de 1951. Para descobrir a vila não convém limitar-se
à Rua Direita. Há que ir à aventura, à descoberta
de ruas e ruelas.
Entre pela Porta da Vila, encimada por uma inscrição, dedicada
à Imaculada Conceição, proclamada padroeira do reino após
a Restauração, em 1640. Observe uma capelaoratório revestida
a azulejos do séc. XVIII, o Padrão Camoneano (1932, Raul Lino),
evocativo do facto de a vila ser referenciada em «Os Lusíadas»,
o pelourinho, uma janela manuelina numa casa situada numa transversal à
Rua Direita (do lado poente) e a inserição evocativa da estada
da Rainha D. Maria I, em 1782 (na antiga casa da família Brito Pegado,
Rua Direita, frente ao Posto do Turismo).
Também pode contornar o burgo pelo alto das muralhas, fazendo o caminho
da ronda, mas cuidado com as irregularidades do piso e a falta de resguardos.
Dentro das muralhas não existem números de polícia, identificando-se
as casas somente pelo nome e rua. De resto, a mais recente planta toponímica
data do séc. XVIII.
Na Praça de Santa Maria, localizado na antiga Casa da Câmara e
posteriormente cadeia fica o Museu Municipal de Óbidos (aberto todos
os dias, das l0h às 12h30 e das 14h às 18h), com uma colecção
de pintura, arte sacra, armas da Guerra Peninsular (colecção doada
em 1961 pela família Pinto Bastos) e fragmentos arquitectónicos
medievais. Na pintura, destaque para obras de Josefa d'Óbidos (em particular
para o retrato do Beneficiado Faustino das Neves), assim como para um calvário
flamengo da passagem dos sécs. XV e XVI, um conjunto de painéis
de São Vicente, da Escola Garcia Fernandes (1540-50), três painéis
de S. Brás, de Diogo Teixeira (1580-90) e obras prováveis de Baltazar
Gomes Figueira (pai de Josefa d'Óbidos), como a «Adoração
dos Magos». Da arte sacra destacam-se uma imagem de S. Sebastião,
da Escola Coimbrã (1515-20), e várias bandeiras de procissão
do séc. XVII, ainda usadas nas comemorações da Semana Santa.
Durante o período de Inverno (de Outubro a Março), encontram-se
abertas ao público as igrejas de Santa Maria de Óbidos, São
Pedro e Misericórdia. No período do Verão (Abril a Setembro),
para além das anteriores, há para visitar a Igreja da Ordem Terceira,
fora de muralhas.
Em termos patrimoniais, a Igreja de Santa Maria, matriz de Óbidos (aberta
todos os dias, das l0h00 às 12h30, e das 14h00 às 18h00), destaca-se
por ser um templo de três naves com vãos de arcadas clássicas,
de origem visigótica. Tendo sido transformada em mesquita durante a ocupação
muçulmana, retomou o culto cristão após a reconquista por
D. Afonso Henriques. Foi com D. Leonor que a igreja ganhou o aspecto actual.
O portal manuelino é encimado por um nicho com uma figura de Nossa Senhora
da Assunção, orago da freguesia. O interior é revestido
por azulejos seiscentistas. A colecção de quadros de autores locais
inclui cinco pinturas na Capela de Santa Catarina (altar colateral direito)
assinadas por Josefa d'Óbidos (1661), oito pinturas sobre madeira no
altar-mor, de autoria de João da Costa (séc. XVII), e os quadros
das naves, de Baltazar Gomes Figueira.
Junto ao altar de Nossa Senhora da Graça (altar colateral esquerdo) fica
o túmulo de D. João de Noronha , «O Moço» (alcaide-mor
de Óbidos), e de sua esposa, D. Isabel de Sousa. Obra-prima do renascimento
português, talhado e esculpido em calcárío brando, é
atribuído a Nicolau Chanterenne, iniciador da escultura renascentista
em Portugal.
A Igreja de S. Pedro (aberta todos os dias, das 9h30 às 12h30 e das 14h30
às 17h00, de Outubro a Março; e até às 19h00, de
Abril a Setembro), foi inicialmente um templo gótico. Destruída
pelo terramoto de 1775, na reedificação aproveitaram-se o antigo
retábulo da capela-mor, a escada do coro e uma parte do pórtico,
hoje integrado na actual fachada (na parte direita há um signo-saímão,
amuleto de sorte).
A capela-mor, abobadada; tem um altar de talha setecentista enquadrando uma
tela atribuída ao obidense João da Costa, representando São
Pedro a receber as chaves do Céu. Neste espaço foi Josefa d'Óbidos
a seu desejo sepultada, pois queria ficar junto da sua madrinha mística,
Nossa Senhora do Rosário. A sepultura situa-se junto á capela
colateral direita, na zona da pia baptismal.
A Igreja da Misericórdia (aberta todos os dias das 9h30 ás 12h30
e das 14h30 às 17h00, de Outubro a Março; e até às
19h00 de Abril a Setembro), foi fundada pela Rainha D. Leonor. O portal, num
estilo barroco incipiente, mantém puros os perfis renascentistas. É
encimado por um nicho com uma curiosa imagem da Virgem em faiança pintada.
O interior é revestido a azulejos azuis e amarelos do séc. XVII,
com altares renascentistas, em talha pintada e dourada.
Neste templo pode observarse um facto curioso. Ao entrar, à esquerda,
encontra a bandeira da Misericórdia de Óbídos, de autoria
de Diogo Teixeira. Durante a crise dinástica de 1580, este artista tomou
o partido de D. António, Prior do Crato. Em 1590, já sob o domínio
dos Filipes, é-lhe encomendada a pintura da bandeira da Misericórdia
de Óbidos. Em vez de representar o rei de então, D. Filipe I,
pintou o Prior do Crato (a primeira figura do lado direito)...
Ainda dentro das muralhas fica a Capela de São Martinho. Sendo propriedade
particular, só excepcionalmente se consegue visitar. Trata-se do único
templo que mantém as características medievais ainda existente
em Óbidos. Construída em 1320, por Pêro Fernandes, possui
um portal gótico-ogival com capitéis. A abóbada destaca-se
pela sua invulgar beleza.
A História também está marcada no exterior da vila: o Aqueduto
da Usseira, o Cruzeiro da Memória, a Igreja da Ordem Terceira (aberta
de Abril a Setembro, às sextas-feiras, sábados e domingos das
9h30 às 12h30 e das 14h30 às 19h00), assim como o Santuário
do Senhor Jesus da Pedra (aberto de Abril a Setembro, excepto às segundas-feiras
das 9h30 às 12h30 e das 14h30 às I 19h00).
Um dos acontecimentos mais interessantes em Óbidos é a Romaria
de Santo Antão, a 17 de Janeiro. Decorre numa capela situada numa colina
fronteira à vila e tem como ponto alto a bênção do
gado, numa cerimónia aparentada com a da Capela de S. Mamede, em Janas
(entre o litoral e Mafra). Partilham-se farnéis e fogueiras e como a
ladeira é íngreme os animais ficam na estrada, à espera
que os donos tragam as fitas devidamente benzidas. Descida nem sempre isenta
de peripécias, pois o vinho corre a rodos.
Em Abril, durante a Semana Santa, a Associação de Recuperação
do Património reatou a realização da Procissão do
Senhor dos Passos. O Verão é o período dos acontecimentos
culturais, com a realização dos Cursos Internacionais de Arte
de Óbidos e da Semana Internacional de Piano (ambos os acontecimentos
em Julho).
Setembro é o mês da Batatada, designação das Festas
de Sant'Ana, realizadas na segunda ou terceira semanas no Pinhal: incluem almoço
colectivo de bacalhau e batatas. Outubro é a vez da Feira de Santa Iria
(dia 20), famosa pelos frutos secos e a batata-doce, montando-se arraial junto
ao Aqueduto da Usseira. É também o mês do já clássico
Festival de Música Antiga.
A ginginha, um dos afamados produtos locais, pode ser adquirida na Loja do Vinho
(Rua Direita), onde se encontram as duas marcas locais (Frutóbidos e
Oppidum), assim como os conhecidos vinhos de concelho: Oiro de Óbidos
e Gaeiras. Igualmente típicos são os bordados, criados em 1950
pela obidense Maria Adelaide Baptista Ribeirete, inspirandose em elementos arquitectónicos
da Igreja de Santa Maria, que podem ser adquiridos na Loja do Lagar (Rua Direita,
junto ao Largo de Santa Maria).
Referência para as verguinhas de Óbidos, na Oficina do Barro (Largo
de Santa Maria).
Na Loja do Simão (ao fundo da Rua Direita) vendem-se as mantas de retalhos
feitas por Laura Santos. João Ramos tece e expõe na Loja do Artesanato
Português (Rua Direita, junto ao Largo de Santa Maria) mantas de tiras
de pano. Quanto a artesanato contemporâneo, as cerâmicas pintadas
de Albino d'Óbidos podem ser vistas na Casa Mourisca (Rua Direita). De
referir, ainda, a pintura em cerâmica de Grazinella Rinaldas (Loja Porão,
Rua Josefa de Óbidos), as telhas pintadas de José Artur Correia
(Espaço Oppidum, início da Rua Direita) e os moinhos de António
Júlio Rodrigues (na sua própria loja, Rua Direita).
No Museu Municipal vende-se o interessante «Óbidos, um Convite
ao Olhar», ilustrado com fotos de Rui Cunha.
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