História de Leiria

 

As origens de Collipo

Collipo


ruínas de Collippo

A cidade romana de Collippo é referida desde o século I pelos autores latinos como sendo um povoado túrdulo situado na faixa atlântica entre Conimbriga e Eburobrittium. Os Túrdulos eram um povo ibérico que viviam na região de Cádiz e que, a certa altura, emigraram para o actual território português, tendo-se fixado na região de Leiria uns 300 au 400 anos antes de Cristo. Teriam escolhido o Outeiro de S. Sebastião para fixar um grande povoado, com certeza devido as suas excelentes condições geo-estratégicas. Este Outeiro, todavia, deveria ser já habitado, pois nas escavações efectuadas ali no Verão de 2002 encontraram-se alguns fragmentos de cerâmica pre-histórica. Aquelas mesmas escavações permitiram recolher algumas ceramicas pre-romanas, provavelmente dos túrdulos, que parece terem escolhido o ponto mais alto do morro de S. Sebastião, onde está hoje o depósito de água, para edificarem o seu povoado. Infelizmente, hoje em dia poucas são as provas da presença destes povos pré-romanos no local, já que a cabeço de S. Sebastião foi totalmente destruído ao longo deste século pelos trabalhos de remoção de terras e extracção de areias que ali teve lugar. O monte onde está hoje o depósito de água, que há umas décadas atrás era bem mais alto, teria sido o local onde se iniciou a história de Collippo, que, começando par ser um povoado pré-romano, rapidamente se transformará ao longo dos primeiros séculos da nossa Era na cidade mais importante da região leiriense. O próprio termo "Collippo" resulta da junção da palavra latina "Collis", que significa colina, outeiro, com o radical túrdulo "-ippo" que significará povoado ou povoado fortificado. O termo Collippo, ele mesmo, testemunha então a união entre os túrdulos e romanos significando povoado ou cidade da colina. No lugar onde se elevou a cidade de Collippo, subsistia, nos primeiros tempos do povoamento leiriense, na Idade Média, o paço de um rico homem chamado Randufo ou Randulfo, como uma das testemunhas que subscreve o foral de Leiria de 1142: Randulfus Zoleimaiz. Este foral refere o local como um núcleo de povoamento merecedor de expressa protecção jurídica, já que, para além de Leiria, aparece ali demarcado para efeitos de justiça Leirenam et Heirenam riuulos et usque ad Palatium Randulfi. Passado alguns anos, em 1152, já este Palácio de Randulfo será freguesia, devendo então, com certeza, existir uma igreja matriz. Esta será pois uma das mais antigas igrejas da área de Leiria e, nos inícios do século XIII, num documento de 1211, Sancti Sebastiani de palacio de randulfo é citado como uma das poucas ermidas que então se espalhavam pelo extenso termo leiriense. As ruínas da antiga cidade que então deveriam marcar aquela paisagem, justificariam, certamente, o destaque que se atribuía ao local. Aliás, a reutilização de sítios antigos pelas igrejas e primeiros núcleos de povoamento cristão nada tem de extraordinário, sendo isso mesmo preconizado por vários bispos desejosos de cristianizar sítios herdeiros de um longo passado cultural. A importância do local nesta altura, e eventual riqueza da sua ermida, é testemunhado arqueologicamente por uma chapa de cobre adornada de esmaltes com policromia brilhante, fazendo parte de um relicário saído das oficinas de Limoges, e datável da primeira metade do século XIII. A peça achada em S. Sebastião, em 1912, a grande profundidade, foi adquirida pelo então Museu Etnológico de Lisboa (nº. de Inv. 4625).

Os frades de Santa Cruz, que por esta altura possuiriam uma herdade próxima do local acabariam por estender o seu domínio às propriedades onde teve assento a cidade romana. Assim, num documento de 3 de Abril de 1544, os frades crúzios emprazavam de novo aquelas terras a domjnguos Carreyra morador em ha quintã de sam sabastiam que d amtyguamente se chamaua ho paqo de Rendulfo mas com a condiçam que nam deixem nem comsytam leuar nhuua pedra grande nem pequena dos Edefiçios antiguos da dita qujnta pera outras hobras de fora della. Estes Edefiçios antiguos só poderiam ser as ruínas da antiga Collippo. A proibição de se retirarem pedras da quinta para hobras de fora della, visa, certamente, acabar com uma prática até aí muito frequente e de tal forma significativa que merece uma atenção particular no documento. Tal prática de delapidação das estruturas romanas já seria corrente, pelo menos, desde meados do século XII, altura em que a local serviu de fonte de abastecimento de matéria-prima nas obras de construção do castelo de Leiria. O desmantelamento das ruínas do antigo burgo romano continuaria até ao nosso século. Em 1909, Tavares Proença Junior teria comprado uma inscrição funerária que, segundo diz nos seus manuscritos guardados no museu de Castelo Branco, teria aparecido ao retirarem pedra das ruínas das edificações do oppidum.

Estas sucessivas delapidações ao longo dos séculos servem para nos ajudar a entender a actual ausência de estruturas bem visíveis e claramente esclarecedoras de ali ter existido uma cidade antiga.

João Pedro Bernardes

In Revista Barreira, Noticias de Leiria, edição 206, de 06 de Junho de 2003

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